Utilizada como matéria-prima na indústria alimentícia, cosmética e farmacêutica, a baunilha natural – obtida a partir da fava de uma trepadeira da família das orquídeas – possui alto valor comercial, devido ao incremento da demanda e redução de oferta no mercado global. Recentemente, a sua cotação no mercado internacional chegou a ultrapassar a da prata, devido a dificuldades na produção em Madagascar, país insular africano que é o principal produtor mundial da planta e foi atingido pelo ciclone Enawo em 2017. O Brasil possui um grande potencial bioeconômico inexplorado, já que reúne a maior diversidade de espécies aromáticas de baunilha, algumas endêmicas – ou seja, só encontradas no País. Diante desse cenário, a botânica Andrea Furtado Macedo coordena, na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), pesquisas sobre diversos aspectos das baunilhas brasileiras, desde a caracterização do perfil das proteínas e metabólitos (proteômico e metabolômico) que constituem as espécies nacionais até o desenvolvimento de novos extratos aromatizantes e perfumantes obtidos a partir delas. O projeto é desenvolvido com apoio da FAPERJ, por meio do edital Auxílio Básico à Pesquisa (APQ 1) e de bolsas de Inovação Tecnológica (INT 4).
No Laboratório Integrado de Biologia Vegetal (LIBV/UniRio), ela explicou a importância do projeto, tanto para a construção de um conhecimento sobre as espécies de baunilhas brasileiras, ainda escasso, e para a preservação dessas espécies, quanto para a avaliação dos possíveis usos sustentáveis da planta. “Cerca de 90% da baunilha natural utilizada no mercado global são oriundos de uma única espécie mexicana, a Vanilla planifolia. Essa é a espécie cultivada principalmente em Madagascar e na Indonésia. Devido a essa baixa variedade genética, qualquer evento climático pode atingir toda a produção mundial de baunilha”, contextualizou.
Andrea destacou que o País possui uma vantagem competitiva, pois a maior parte das espécies aromáticas que pertencem ao gênero Vanilla se encontra em território nacional, mas é completamente desconhecida tanto do ponto de vista científico quanto comercial. “O estado do Rio de Janeiro tem espécies aromáticas, como a Vanilla bahiana e a Vanilla chamissonis, que coletamos na cidade do Rio, nas regiões costeira e serrana. Há ocorrência de baunilhas também em outros biomas brasileiros, como Amazônia e Cerrado”, citou.
Um dos destaques do estudo foi o desenvolvimento, no LIBV/UniRio, de formulações bioquímicas inovadoras de agentes flavorizantes, aromatizantes e perfumantes, obtidos a partir dos extratos de baunilhas da biodiversidade brasileira. Essas fórmulas resultaram em dois pedidos de patentes, já depositados com sucesso no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI).
“Desenvolvemos formulações feitas das espécies Vanilla bahiana, Vanilla chamisonis e Vanilla cribbiana. Para comercializar as tecnologias geradas a partir do conhecimento acadêmico, criamos uma spin-off, uma empresa de base tecnológica, que denominamos OmicBlend – Inteligência Sensorial. Esse trabalho é fruto da parceria com Joana Paula S. Oliveira, que é minha orientanda de Doutorado na pós-graduação da UniRio e diretora-científica da OmicBlend”, detalhou ela, que é professora da Pós-graduação em Ciências Biológicas (Biodiversidade Neotropical) na universidade.
O grupo de pesquisa atua em diversas frentes de investigação, incluindo a caracterização metabolômica e genética das espécies nacionais. “Caracterizamos o perfil proteômico e metabolômico de diversas espécies de baunilhas brasileiras. Um dos resultados foi a publicação, em 2019, de artigo na revista científica Food Research International, intitulado Vanilla bahiana, a contribution from the Atlantic Forest biodiversity for the production of vanilla: A proteomic approach through high-definition nanoLC/MS”, contou Andrea. E acrescentou: “Trabalhamos também na caracterização genética de nove espécies de baunilhas brasileiras, encontradas em regiões como Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica. Esse é o tema da tese de Doutorado que está sendo desenvolvida pelo meu orientando, Tibério da Silva Vale, no PPGBIO/UniRio”, citou.
Com auxílio da modelagem computacional, o grupo investiga ainda outros aspectos e potenciais usos das espécies de baunilha brasileiras. “Trabalhamos com a modelagem ecológica, que é o mapeamento virtual das áreas com potencial de distribuição, conservação e cultivo dessas espécies. Também fazemos uma modelagem da bioatividade das moléculas, ou seja, investigamos as potenciais atividades biológicas e farmacológicas que as moléculas extraídas das baunilhas podem ter. Uma delas é o uso da vanilina, molécula extraída da baunilha, no tratamento de doenças neurológicas, como o Alzheimer. Estamos investigando ainda suas propriedades antitumorais. Essa é uma linha de trabalho que precisa de mais esforços de pesquisa, dentro desse amplo leque de estudos da baunilha”, concluiu.
Fonte: FAPERJ (Por: Débora Motta/ Ascom Faperj)