| Em 27/06/2024

Inteligência Artificial reduz o risco relacionado ao banho no leito em UTIs

Treinamento dos pesquisadores assistentes para a realização do banho no leito no Laboratório do Departamento de Medicina e Enfermagem da UFV (Créditos: Luana Toledo/UFV)

A Inteligência Artificial (IA), está chegando às Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), para facilitar tomadas de decisão e preservar vidas de pacientes em estado crítico.

Um novo estudo, publicado este ano na Revista Brasileira de Enfermagem, registra a utilização, pela primeira vez, de IA para estimar o tempo de execução do banho de leito em pacientes críticos, internados em UTIs. O projeto foi apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) e pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). A coordenadora Luana Vieira Toledo, professora do Departamento de Medicina e Enfermagem da Universidade Federal de Viçosa (UFV), conta que o banho no leito é uma prática comum nas UTIs que apresenta riscos para quem o recebe.

“O ato de banhar pode parecer simples e rotineiro, mas para um paciente que está acamado, dependente de cuidados, não é tão simples assim. Senão há rigor adequado, você pode gerar maior risco de infecção”, explica. Durante o procedimento, a equipe de enfermagem toma uma série de cuidados, prezando pela segurança física do paciente, pois cada movimentação gera gasto de energia que pode causar variações importantes nos sinais vitais, com risco de provocar paradas cardíacas.

Coordenadora do projeto, Luana Toledo, foi vencedora do Prêmio Capes de Teses 2021 (Foto: Arquivo da pesquisadora)

Na rotina de muitas UTIs, a intervenção é distribuída entre os profissionais da equipe de enfermagem de forma aleatória, sem avaliação da demanda assistencial de cada paciente e da carga de trabalho requerida. “Muitas vezes, o técnico de enfermagem tem que dar banho em vários pacientes durante o turno dele. São quatro, cinco, até 10 banhos por turno”, conta Toledo. Dessa forma, não é possível garantir que todos os profissionais tenham a mesma carga de trabalho no fim do dia.

A ideia foi encontrar uma maneira de prever o tempo de banho que cada paciente irá demandar, garantindo um ganho gerencial e assistencial ao fornecer uma ferramenta digital que oriente a tomada de decisão dos profissionais de Enfermagem e a divisão do trabalho de forma mais igualitária entre os técnicos, inclusive evitando expor o paciente a riscos desnecessários.

“Se, a partir da predição do tempo de banho, a gente percebe que será muito demorado (superior a 20 minutos) e, ao avaliarmos o paciente, percebermos que ele não está estável devemos nos questionar: será que compensa dar o banho nele hoje?  […] Um paciente que demanda um banho mais prolongado provavelmente exige maior demanda assistencial, mas precisamos pensar que a condição clínica dele pode não permitir um banho com duração superior a 20 minutos porque é considerado um banho com risco para instabilidade hemodinâmica”, explica Toledo.   

Coleta de dados

Para solucionar o problema, a pesquisadora testou diferentes métodos de IA para predizer o tempo de banho, considerando o estado de saúde de cada paciente.  A equipe de pesquisa chegou às chamadas Redes Neurais Artificiais (RNA) – metodologia inspirada na arquitetura dos neurônios humanos – para reconhecer padrões diante de uma quantidade grande de dados e reproduzir aprendizado. É a mesma lógica utilizada por sistemas como Siri, Google Now e Google Translate.

O algoritmo utilizado na pesquisa recorre ao banco de dados produzido ainda durante a pesquisa de doutorado de Toledo. Para o estudo, a pesquisadora realizou, juntamente com outros pesquisadores assistentes, o banho de leito de 50 pacientes críticos em uma UTI na cidade de Viçosa. Foram coletadas informações sociodemográficas e clínicas, como o tempo de execução do banho, idade, gênero, presença de comorbidades, uso de sedativos e dispositivos invasivos utilizados para o tratamento de pacientes críticos.

A ferramenta conseguiu alcançar uma precisão de 68,6% na previsão do tempo de banho dos pacientes acamados. Para validar os resultados e ampliar o banco de dados, a equipe de pesquisa avança na coleta de dados em outras três unidades de terapia intensiva. Até então, já somam dados de mais 300 banhos realizados em diferentes instituições para verificar a qualidade dos resultados do algoritmo e a necessidade de incluir novas variáveis.

A pesquisa segue na construção de uma ferramenta online que deve ser disponibilizada gratuitamente. O aplicativo web servirá para orientar as equipes de enfermagem na tomada de decisão sobre a realização do banho no leito de forma mais segura e na otimização da divisão do trabalho de forma equânime, contribuindo com a redução da sobrecarga e absenteísmo dos profissionais da saúde responsáveis pela função nas UTIs.   

Enfermagem e IA

Toledo conta que, na área da saúde, os estudos de predição têm avançado, mas na Enfermagem ainda são incipientes. Para ela, isso deve-se a uma ausência de financiamento nos estudos desta natureza, à ausência de conteúdos relativos à informática e IA nas estruturas curriculares dos cursos de graduação em Enfermagem e, especialmente, à fragmentação dos bancos de dados de prontuários eletrônicos.

A maioria dos estudos na área são internacionais, em menor proporção nacionais. São estudos que observam a aplicabilidade da inteligência artificial, avaliando métodos de ensino, avaliando o uso de simuladores virtuais, observando as emoções dos estudantes ao serem submetidos a uma determinada metodologia ativa. Outros buscam ferramentas para predizer a gravidade de um paciente e a necessidade de acionar um time de resposta rápida capaz de intervir em casos de parada cardíaca, por exemplo.  Alguns também utilizam IA para avaliar lesões por pressão e orientar a melhor conduta técnica.

A pesquisadora ainda cita estudos que fazem o processamento da linguagem natural – quando se observam dados da evolução dos pacientes e utilizam-se ferramentas como o ChatGPT para criar um plano de cuidados personalizado. Para Toledo, com a aplicação da IA à área da saúde, estaríamos “abrindo uma caixa de pandora”. É um caminho inevitável, mas que não pode renunciar à humanização.

Para a pesquisadora, nestes casos, é preciso observar os resultados apresentados por ferramentas como o ChatGPT sem os levar como verdade absoluta, pois elas podem carregar viés e produzir inferências negativas, além de orientar intervenções que podem ser desnecessárias e até maléficas para o paciente. Por isso, defende que os profissionais sejam alfabetizados para fazer o uso racional e responsável dessa IA. 

Fonte: FAPEMIG (Por: Júlia Rodrigues/ Ascom Fapemig)

Leia também

Em 17/09/2024

Governo do Tocantins investe R$ 2,6 milhões no apoio a projetos de pesquisa que promovam o desenvolvimento sustentável

O Governo do Tocantins, por meio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Tocantins (Fapt) e da Secretaria Estadual de Planejamento (Seplan), lançou o edital da Rede de Desenvolvimento Regional do Tocantins (Rede Deser). O edital apoiará projetos de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) voltados às regiões dos quatro Centros de Desenvolvimento Regional (CDRs), sendo eles […]

Em 17/09/2024

Governo do Acre promove cultura inovadora concedendo bolsas de estudo para mães solo e pesquisas sobre autismo

O governo do Acre vai continuar incentivando a cultura inovadora. O presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Acre (Fapac), Moisés Diniz, anunciou a concessão de bolsas de estudo para Mães da Ciência e Mentes Azuis. Os programas visam apoiar e incentivar pesquisadores, doutores, mestres e graduados, mães solo e mães atípicas […]

Em 16/09/2024

Lançada chamada CONFAP – ERC IA 2024

O Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (CONFAP) lançou nesta segunda-feira, 16 de setembro, a chamada CONFAP – ERC IA 2024, em parceria com o Conselho Europeu de Pesquisa (ERC). A chamada é lançada no âmbito do Acordo de Implementação (Implementing Arrangement – IA) assinado entre a Comissão Europeia e o CONFAP […]

Em 16/09/2024

FAPEPI celebra 30 anos com Documentário que destaca Ciência, Tecnologia e Transformação de vidas

Em um marco significativo para a ciência e a inovação no Brasil, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Piauí (Fapepi) está comemorando três décadas de conquistas com o lançamento de um documentário revelador. Intitulado “Fapepi: 30 Anos de Ciência, Tecnologia e Inovação – Transformando Vidas e Futuros”, o filme oferece uma visão […]

Em 13/09/2024

Mais pesquisadores mineiros serão beneficiados com bolsas de produtividade

Em agosto, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) assinaram novo Acordo de Cooperação Técnica com foco nas Bolsas de Produtividade em Pesquisa (PQ). A parceria foi anunciada durante o seminário em comemoração aos 39 anos da FAPEMIG, realizado no último dia 28. Por […]

Em 12/09/2024

Metodologia permite testar de forma remota a mobilidade e a força muscular de idosos com demência

Pesquisa conduzida na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) mostrou que é possível adaptar testes de mobilidade funcional e de força muscular para que sejam realizados no ambiente doméstico, de forma remota. A proposta é atender pessoas idosas com demência por telessaúde, a partir de um protocolo que envolve o treinamento de cuidadores e a […]

Em 17/09/2024

Edital vai apoiar pesquisadores negros e indígenas em projetos de transição energética no Nordeste

Com o objetivo de ajudar na preparação de uma nova geração de pesquisadores negros e indígenas para pensarem em soluções baseadas em ciência e tecnologia que atendam às necessidades de suas comunidades, o Projeto Mukengi (lê-se: muquêngui) abriu inscrições para sua terceira edição, desta vez com foco no tema “economia verde”. A iniciativa do Instituto Mancala, com apoio […]