Novos derivados contra a dor neuropática e alternativas contra a depressão são apenas duas dentre dezenas de iniciativas do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) de Fármacos e Medicamentos (Inofar) que já depositou 58 patentes, além de mais de mil artigos científicos publicados em periódicos nacionais e internacionais. A rede de pesquisa, financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela FAPERJ, visa uma ampla atuação que vai da descoberta de novos candidatos a fármacos ao acompanhamento de ensaios pré-clínicos e de toxicidade.
O Inofar reúne 27 grupos de pesquisa, de 20 diferentes instituições de ensino superior oriundas de 11 estados brasileiros. O vice-coordenador da rede, Carlos Alberto Manssour Fraga, conta que a busca por candidatos a fármacos analgésicos capazes de atuar contra dor neuropática começou, em 2012, no laboratório de Avaliação de Síntese de Substâncias Bioativas (LASSBio) – tradicional grupo de pesquisa de química medicinal, localizado no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e levou à produção de moléculas sintéticas com ação sobre canais de sódio relacionados à dor neuropática.
Nos últimos anos, estudos nacionais e internacionais na área de fármacos têm sido divulgados sobre a importância dos canais de sódio e de potássio na fisiologia da doença, porque os analgésicos comuns, que utilizam outros mecanismos de ação, não são capazes de controlar esse tipo de dor. As evidências desses estudos apontam que bloqueadores dos canais de sódio podem se configurar em promissores candidatos a fármacos.
Provocada por uma lesão no sistema nervoso periférico, a dor neuropática é considerada uma condição clínica grave e refratária aos tratamentos convencionais. Estimativas apontam que um terço da população brasileira conviva com dor há mais de três meses. Muito intensa, esse tipo de dor pode afetar a qualidade de vida, incluindo sintomas de estresse, ansiedade e depressão.
Manssour ressalta a importância da seletividade de novos compostos eficazes contra essa condição. Ele explica que até a escolha de uma molécula candidata, várias substâncias foram desenvolvidas e testadas in vitro e em experimentos com animais para determinar desde a estabilidade das substâncias aos efeitos analgésicos em modelos animais, incluindo a toxicidade. Os resultados obtidos com uma das moléculas selecionadas no estudo original são animadores, pois demonstraram uma capacidade de reversão total da dor induzida em modelos animais, o que acabou gerando a assinatura de um acordo de cooperação técnica com a Eurofarma, em 2019. Criada em 1972, a Eurofarma é a primeira multinacional farmacêutica de capital 100% brasileiro.
A classe de substâncias originalmente desenvolvida no LASSBio se diferencia do que há no mercado por apresentar um mecanismo de ação inovador quando comparado aos analgésicos disponíveis no mercado, que basicamente atuam como moduladores da biossíntese de prostaglandinas (como os antiinflamatórios não-esteroidais), do sistema endocanabinóide (como a dipirona) ou de receptores opióides (como a morfina) e apresentam limitada eficiência contra este tipo de dor crônica.
Os próximos passos desse acordo entre a UFRJ e a Eurofarma inclui a otimização das propriedades fisico-químicas da substância, sua eficácia e duração dos efeitos analgésicos e de toxicidade em ensaios pré-clínicos que estão sendo coordenados pela farmacêutica. Somente após esses ensaios, é que a empresa pode eleger um candidato para a realização de ensaios clínicos. Manssour estima que, em um cenário positivo, os ensaios pré-clínicos sejam finalizados em até dois anos e a possível chegada ao mercado de novos fármacos contra dor neuropática possa ainda exigir alguns anos.
Depressão
Um outro protótipo candidato a fármaco em desenvolvimento pela rede de pesquisa é contra depressão. Manssour explica que este projeto é mais recente e foca em alvos epigenéticos, isto é aqueles capazes de mexer com a expressão gênica sem alterar a que reúne características do ambiente e da genética, para o desenvolvimento de moléculas terapêuticas. Entre essas substâncias, o grupo da UFRJ testa novas moléculas como inibidores de histonas desacetilase. As histonas desacetilase são uma vasta família de enzimas que desempenham uma série de papeis cruciais em inúmeros processos biológicos. Este projeto gerou uma patente depositada no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), concedida em 2022 e, segundo Manssour, promete.
Ele explica que os medicamentos atualmente disponíveis para o tratamento da depressão atuam em diferentes aspectos da doença e em alguns casos também apresentam eficácia limitada. As moléculas desenvolvidas pela rede Inofar agem para inibir a atividade de histona desacetilase e podem contribuir para a identificação de candidatos a fármacos inovadores. A pesquisa, com o uso desse tipo de inibidores enzimáticos, tem sido a aposta de inúmeras farmacêuticas, pois os experimentos com animais demonstraram a possibilidade de reverter quadros comportamentais de depressão, ansiedade e outros distúrbios do sistema nervoso central.
A pesquisa com os novos protótipos antidepressivos foi objeto de novo acordo de cooperação técnica com a Eurofarma, firmado em 2022, e que foca na otimização estrutural dessas moléculas e a seleção da mais semelhante àquelas originalmente desenvolvidas pelo grupo do LASSBio. Manssour acredita que até completar os ensaios pré-clinicos, esta pesquisa com candidatos à fármacos antidepressivos consumirá ainda por volta de dois a três anos.
Fonte: FAPERJ (Por: Claudia Jurberg/Ascom Faperj)
SIGA O CONFAP NAS REDES SOCIAIS: