| Em 29/08/2024

Pesquisa usa IA Explicável para desenvolver novos medicamentos

O professor André Pimentel (à dir.), do Laboratório de Sistemas Complexos da PUC-Rio, orientou o aluno de Iniciação Científica Lucca Caiaffa Santos Rosa, coautor do trabalho sobre novo método computacional, usando Inteligência Artificial Explicável (Foto: acervo pessoal)

Pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) desenvolveram um novo método computacional, usando Inteligência Artificial Explicável. A tecnologia permite analisar grandes volumes de dados toxicológicos, levando a avanços significativos no desenvolvimento de novos medicamentos em diversas áreas da Medicina. 

As pesquisas são coordenadas pelo professor André Silva Pimentel, do Laboratório de Sistemas Complexos, no Departamento de Química, do Centro Técnico Científico da PUC-Rio. O pesquisador explica que a descoberta e o desenvolvimento de novos medicamentos são tradicionalmente processos lentos, caros e arriscados. “Muitas vezes, após anos identificando substâncias terapêuticas, as pesquisas são interrompidas devido a falhas nos testes de toxicidade ou efeitos colaterais,” ressalta. “Porém, muitos desses entraves poderiam ter sido evitados antecipadamente com uma compreensão mais clara dos mecanismos de ação dos novos compostos.”

Diferentemente da IA tradicional, que muitas vezes funciona como uma “caixa preta” com processos internos obscuros, a Inteligência Artificial Explicável permite obter conhecimento das características mais importantes do sistema e como elas se relacionam. “Com isso, a confiança e a precisão dos pesquisadores ao interpretar como funcionam os sistemas aumentam consideravelmente. Assim, possibilita explicações claras sobre quais características específicas das substâncias levam a determinadas propriedades biológicas ou toxicidade”, acrescenta Pimentel.

Com essa tecnologia, a equipe conseguiu identificar potenciais estruturas de interesse, detalhando as partes específicas das moléculas que influenciam sua toxicidade ou eficácia terapêutica. Isso não apenas acelera a identificação de promissores candidatos a novos medicamentos, mas também melhora a segurança e a eficácia dos novos medicamentos.

Aplicações no cérebro

Em estudos recentes, publicados na ACS Chemical Neuroscience, a equipe utilizou esse método para melhorar a entrada de medicamentos no cérebro. Isso é relevante para o tratamento de diversas condições, como dores de cabeça, doenças neurodegenerativas, meningites e até cânceres.

A barreira hematoencefálica, uma membrana que protege o Sistema Nervoso Central de infecções e substâncias tóxicas, também impede a passagem de 98% dos medicamentos em potencial. A pesquisa identificou moléculas ativas contra doenças neurodegenerativas e explicou por que conseguem atravessar essa barreira. Esse avanço pode aprimorar o desenvolvimento de novos medicamentos para tratar essas condições, oferecendo esperança a cerca de 3,4 bilhões de pessoas que possuem alguma doença neurológica.

A barreira hematoencefálica é composta principalmente de gordura, o que facilita a passagem de compostos com afinidade por substâncias gordurosas. No entanto, nem sempre essa afinidade é o suficiente. Os resultados da pesquisa mostraram que a presença de grupos químicos específicos, como aqueles contendo nitrogênio, desempenha um papel crucial nessa permeabilidade. Compostos como a cloroquina, anfetamina e alguns analgésicos opióides são exemplos.

Já em medicamentos como os corticosteróides, usados para tratar inflamações, átomos de flúor e cloro podem aumentar a permeabilidade, facilitando a passagem ao cérebro.

Compostos tóxicos

Em outro trabalho recente, publicado na revista da Royal Siety of Chemistry  (https://doi.org/10.1039/d4me00038b), a metodologia foi aplicada para compreender melhor o que faz algumas substâncias induzirem mutações genéticas que podem causar câncer e devem, portanto, ser evitadas no desenvolvimento de medicamentos.

A análise confirmou a relevância de compostos já conhecidos como causadores de mutações, como os usados na fabricação de corantes; óxidos de amina encontrados em shampoos, condicionadores e detergentes; epóxidos para fabricar resinas epóxi e vários plásticos; e nitrosaminas encontradas em cerveja, peixes, e derivados da carne e do queijo preservados com conservantes.

Além disso, foram identificados novos compostos, incluindo alguns que fazem parte de corantes como anilina, amplamente usados na produção de produtos químicos (aminas aromáticas). Outros estão presentes na fórmula de antigos analgésicos à base de acetanilida, que já saíram de circulação por terem efeitos colaterais (amidas aromáticas). Também observaram estruturas comumente encontradas em explosivos (nitrocompostos), solventes (carboxamidas), agentes de conservantes químicos (azidas) e da fumaça de cigarro, de churrasco e alimentos grelhados (hidrocarbonetos aromáticos policíclicos com uma região de baía).

Segundo Pimentel, essas estruturas foram consistentemente encontradas em todos os conjuntos de dados analisados, mostrando padrões claros que influenciam a sua classificação como mutagênicos.

Outras aplicações

O método tem se mostrado útil em diversos campos da toxicologia. O pesquisador acrescenta que seu grupo está finalizando outro estudo na mesma linha, que busca identificar por que algumas substâncias com as quais entramos em contato podem ser reconhecidas como hormônios pelo corpo, conhecidos como disruptores endócrinos. Exemplos já conhecidos incluem os esteroides em anabolizantes e anticoncepcionais, inseticidas como DDT e compostos na fabricação de plástico como BPA. Eles podem aumentar a ação ou até mesmo bloquear a produção de hormônios, causando graves problemas de saúde.

Pimentel acredita que os resultados têm implicações práticas promissoras. “Esperamos que, ao compreender os mecanismos de ação de cada uma dessas subestruturas, possamos promover mudanças significativas no desenvolvimento de métodos alternativos para avaliar melhor os riscos e criar medicamentos mais eficientes”, afirma. “Além disso, à medida que a Inteligência Artificial continua a desempenhar um papel mais importante na medicina, é importante garantir que essas metodologias sejam explicáveis e interpretáveis, fatores essenciais para ganhar a confiança da comunidade médica e da população”. 

Os estudos foram desenvolvidos com o apoio da FAPERJ e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Fonte: FAPERJ (Por: Marina Verjovsky/ Ascom Faperj)


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